domingo, 25 de janeiro de 2009

Homenagem Póstuma

Eu adorava aquela mangueira.

Ela fazia sombra e me oferecia o sabor mais delicioso dentre os mais de vinte tipos de fruta que eu posso relacionar, havia no meu quintal. Nela meu pai amarrava a ponta de uma corda de nylon por onde eu fazia subir, num abrir e fechar de braços, um aviãozinho de plástico quando era criança. Aquela mangueira foi testemunha das minhas primeiras decolagens.

Ao contrário de outras árvores do meu quintal, nela eu não subia. Seu tronco era muito alto e os galhos começavam a se espalhar numa altura que desaconselhava tal atrevimento. Ela se impunha e eu, que uma vez cortei a foiçadas um mamoeiro simplesmente por estar no caminho da minha bicicleta, respeitava-a.

Também nunca feri seu tronco para escrever nomes dentro de um coração mal desenhado. Ela não merecia sofrer por causa dos meus amores infelizes.

Mas um dia, ela mesma reconheceu-se infeliz e, ao contrário de mim que insisto em viver, decidiu que devia morrer. Então ela, que sempre foi tão querida viva, morta tornou-se um perigo, pois diziam estar prestes a desabar no telhado do vizinho. Chamaram um estranho (que não amava como eu a minha mangueira) e ele lançou-se sobre ela de maneira impertinente e cortou-lhe os galhos secos. Ninguém viu, mas eu subi no terraço de onde ficava a sua altura e chorei. Chorei porque achei que ela também chorava. Ela não estava morta, estava viva dentro de mim, e a cada machadada, só eu ouvia seus gritos de dor. Eu também sentia dor.

A dor da saudade da minha infância, que me é uma lembrança tão querida e incrivelmente recente! A dor por todas as coisas que perdi e por todos os que se foram e não voltam mais.


Acrescentei mais um item a minha coleção de perdas.
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2 comentários:

Caraca, Lieginha, nunca imaginei que você choraria por causa daquela mangueira... sério. Mas entendo muito bem este sentimento. Eu mesma não fico indiferente a nenhuma árvore que (mesmo quando necessário) sofra violências, coraçõesinhos ou machadadas. Foi realmente uma pena. Pra você, pro quintal, pro planetinha a cada dia mais quente... Meus pêsames!

eu gostava da polpa desta arvore.

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